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O estudo psicológico do racismo pode ser resumido em poucas palavras: necessidade de evolução. É certo que a forma como a sociedade pensa sobre o racismo mudou nos últimos anos, com isso, o discurso psicológico também mudou, mas tal não implica que não reconheçamos a necessidade de continuarmos a evoluir.
Os mecanismos de negação são compreensíveis, mas nada resolvem. Não adianta negar o óbvio: o racismo está ainda bem vivo na nossa sociedade e sobre ele devemos ter pensamento e ação. Aliás, o racismo não implica apenas os atos diretos de discriminação, mas envolve outro mecanismo: a complacência. E a verdade é que existem, ainda, muitas pessoas (demasiadas) complacentes com o racismo (seja por omissão, negação, justificação, inação, …).
Assim, mais do que encarar os fenómenos de racismo do ponto de vista individual, importa analisá-lo do ponto de vista psicológico-cultural, abordagem que permite ver o racismo enquanto um conjunto de ideias e práticas inseridas na cultura, onde os indivíduos moldam a cultura e a cultura molda os indivíduos.
O racismo não se refere apenas a indivíduos que demonstram preconceito racial ou se envolvem em atos diretos de discriminação racial; muitas vezes, é menos óbvio e muito mais insidioso, afetando instituições (como os sistemas de justiça, policiais, de ensino, ação social, …).
Mas porque existe o racismo?
Continuamos a falar da ideia preconceituosa de quem se acha mais "apto" deve dominar e sobrepor-se ou de mecanismos de defesa psicológica para ajudar as pessoas a se identificarem com um grupo primário e se sentirem mais seguras? Deixo uma lista de possíveis explicações psicológicas para a existência do racismo:
Insegurança Pessoal
É verdade que aqueles que não têm identidade e lutam contra a insegurança podem buscar a filiação a um grupo. Consequentemente, após encontrar um grupo, os membros podem começar a alienar pessoas que não fazem parte dele. Às vezes, surge hostilidade em relação às pessoas que foram alienadas. Num grupo, as pessoas tendem a pensar e a se comportarem mais como as pessoas com quem se relacionam. Torna-se muito mais fácil atacar os outros quando se está entre pessoas que compartilham o mesmo ponto de vista.
Falta de Empatia
A alienação dos outros acaba levando a menos compaixão e empatia por aqueles que são marginalizados. As pessoas começam a demonstrar empatia apenas por aqueles com quem se relacionam regularmente. A rejeição do outro pode ou não ser racismo explícito, mas começa sempre com a falta de empatia.
Projeção de Falhas Pessoais
Quando as pessoas se sentem mal consigo mesmas ou reconhecem as suas incapacidades, em vez de lidar com elas e tentar corrigi-las, podem projetar a sua autoaversão nos outros. Grupos marginalizados ou minoritários podem facilmente tornar-se bodes expiatórios para aqueles que ignoram as suas próprias falhas pessoais.
Problemas de Saúde Mental
O racismo é um sinal de problemas de saúde mental? Não necessariamente, mas pode ser. Por exemplo, o transtorno de personalidade paranoide e o narcisismo são perturbações de saúde mental caracterizadas, em parte, por sentimentos de insegurança, que podem tornar uma pessoa mais propensa a ter crenças racistas ou a envolver-se em comportamentos racistas.
Ódio e Medo
O ódio extremo quase sempre se baseia no medo. As pessoas podem sentir-se ameaçadas por pessoas que consideram "diferentes" ou "estrangeiras". Elas podem temer perder poder. Para combater esse medo, algumas pessoas podem buscar o apoio social de outras com medos semelhantes, perpetuando o ciclo racista.
Que fatores contribuem para o Racismo?
Com certeza que existirão vários, deixo alguns fatores que podem explicar:
Categorias
Os humanos aprendem a agrupar pessoas em categorias com base em diferentes características desde cedo. As categorias raciais não são inatas, mas são muitas vezes ensinadas às crianças desde cedo.
Facções
Categorias levam a fações nas quais as pessoas são atribuídas a um grupo racial e começam a identificar-se fortemente com seu grupo racial. Perceções positivas do grupo racial atribuído e o desejo de demonstrar cooperação, lealdade e empatia pelo grupo comumente levam a comportamentos que beneficiam o grupo, em detrimento de outro grupo. Além da lealdade ao próprio grupo, os membros do grupo também podem começar a demonstrar hostilidade em relação a outros grupos como resultado de competição real ou percebida ou de ameaças à sua autoimagem, valores ou recursos.
Segregação
Ser segregado de outros grupos raciais influencia significativamente as atitudes e os sentimentos em relação à raça. A falta de contato com outros grupos raciais tende a restringir e endurecer as crenças e opiniões de uma pessoa sobre os outros e oferece poucas chances de que crenças negativas sejam questionadas.
Hierarquia
Um sistema hierárquico atribui riqueza, poder e influência de forma desigual entre os grupos. As hierarquias são ainda mais reforçadas por crenças que atribuem poder e status a características individuais em vez de influências sistemáticas, resultando, em última análise, na crença do grupo dominante de que é, de facto, superior aos grupos não dominantes.
Media
Os meios de comunicação social desempenham um papel na sustentação do racismo. Quando os media retratam consistentemente um elenco maioritariamente branco de actores em programas de televisão, filmes, telejornais, telenovelas, …, isso torna a cultura branca a cultura "dominante" ou "normal".
Passividade
O último fator e talvez o mais importante. É o racismo passivo que resulta da ignorância, da apatia ou da negação. Quando o racismo é sistémico e enraizado nas estruturas sociais, tudo o que é necessário para sustentá-lo é a inação. As pessoas não precisam ser ativamente racistas nas suas crenças e ações para apoiar sistemas racistas — elas simplesmente precisam "não fazer nada" para mudar esses sistemas.
Combatendo o Racismo e Promovendo o Antirracismo
Diante da magnitude do racismo, pode ser fácil sentirmo-nos impotentes. Mas há coisas que podemos fazer individualmente para influenciar tanto o racismo interpessoal quanto o sistémico. Deixo algumas formas de combater o racismo individualmente:
- Direcione a atenção para o problema do racismo em vez de varrê-lo para debaixo do tapete ou fingir que ele não existe.
- Quando ouvir atitudes racistas, questione-as; pergunte às pessoas o motivo por trás de seus pensamentos e incentive-as a considerar alternativas.
- Lembre-se de que a mudança não acontece da noite para o dia e seja paciente quando parecer que o progresso está sendo feito lentamente; mesmo pequenas mudanças podem levar a grandes resultados quando você for consistente nas suas ações.
- Ensine inclusão e empatia às crianças desde cedo, para que elas cresçam e se tornem adultos capazes de identificar o racismo e contestá-lo.
- Realize pesquisas psicológicas sobre como as normas sociais mudam e a melhor forma de implementar sistemas que resultem em mudanças de atitude das pessoas do grupo dominante, para que os sistemas também sejam afetados.
- Busque e fomente amizades entre pessoas de diferentes origens para que você possa começar a ver as pessoas como indivíduos, e não apenas como parte de um grupo racial.